Recebi um email muito querido de uma leitora que comentou que descobriu o blog na sua segunda gestação e que ele foi de grande ajuda. Infelizmente, sua segunda filha morreu apenas 10 dias depois do nascimento e ela perguntou se eu poderia falar um pouco sobre o luto, essa dor que ela está passando e pela qual muitas mulheres também passam. A perda gestacional (aborto espontâneo) e a morte do recém-nascido infelizmente são mais comuns do que a gente gostaria.
Como não tenho experiência no assunto, mas entendo que é um tema muito importante, pedi ajuda para as psicólogas Raquel Benazzi e Luciana Romano, do Núcleo Corujas, e elas me passaram o texto abaixo. Espero que possa ajudar a minha querida leitora e também outras mães que infelizmente passaram por essa situação.
O tema luto durante a gestação ou após ela ainda é um tabu, pouco falado entre as mães que sofrem essa situação, e também pouco falado pelos profissionais da saúde, que muitas vezes não sabem lidar com essa angústia da mulher, que deseja ser mãe, porém sofre a perda desse filho tão esperado.
Ao ser diagnosticada a perda de um filho intraútero, ou logo após seu nascimento, a mulher e o homem, os pais, sofrem uma angústia, pois a espera pelo bebê idealizado acaba e entra em seu lugar o luto.
É importante lembrar que mesmo que a mãe e o pai vivenciem tudo junto, para cada um o luto é sentido de forma diferente pelo vínculo que foi estabelecido com esse bebê durante a gestação. O vínculo parental é estabelecido na gestação e é um processo complexo e único.
As perdas intrauterinas ou perinatais afetam mais a mãe do que qualquer outra pessoa, devido à ligação materna que existiu durante a gestação. Dessa forma entende-se que a dor da mãe é mais intensa se comparada a da família.
A perda de um filho é a maior intensidade do vínculo afetivo parental e torna a experiência dolorosa, o que coloca o indivíduo frente a sua impotência. Ao se perder um filho, junto com ele se perdem as expectativas do futuro, sua vivências, alegrias e tristezas, já que neles são depositados os sonhos e desejos dos pais. Um filho além de uma extensão biológica, também é uma extensão psicológica parental já que foi investido cuidado e atenção nessa criança. Por isso, a perda do filho é vista como uma perda do pedaço de si mesmo.
A paixão de perder o filho ressalta não só a ameaça da perda de sua sobrevivência, mas também a sobrevivência parental por meio deles. Sendo assim, o filho faz parte da estrutura psíquica dos pais e ao morrer, uma parte dos pais morre junto com o filho.
Devido à morte da parte dos pais, estes devem fazer uma readaptação social apesar de todos os sentimentos que vivenciam no momento como: tristeza, arrependimento, medo, saudades e ausência. O luto é uma ferida que necessita de atenção e cuidado para ser curada e é composto por algumas etapas psicológicas. A primeira etapa é a aceitação da morte e o reconhecimento do fim de uma relação em vida.
A segunda etapa implica em experimentar os sentimentos que promove a superação e deixa o luto acontecer naturalmente. O processo de luto pode durar anos e ser revivido em aniversários, feriados de morte, entre outros.
Durante essas etapas, a pessoa se mostra apática e desamparada, perde seu senso de objetividade e vive sua rotina de forma igual e sem prazer. Tende a se afastar das pessoas queridas, principalmente se estas lembram o falecido, o que facilita o início do estágio da depressão após a perda.
No primeiro momento dessa depressão, logo após a perda, com a vivência do luto, os pais se apresentam com muita negatividade, não conseguindo estabelecer vínculos afetivos, devido à decepção que viveram.
Para auxiliar nesse momento de luto, o mais adequado é dispor do auxílio de um profissional especializado e às vezes é necessário o uso de medicação. A expressão da tristeza, frustração e da morte devem ser transformadas significativamente para que a pessoa se recupere.
A pessoa deprimida vive no passado, não consegue viver o presente, nega-se e não compreende sua doença, além de poder persistir num futuro irreal, como se a vida passada fosse retornar.
Como o assunto ainda é um Tabu, muitas mulheres que perdem seus filhos não encontram apoio por não se sentirem a vontade de compartilhar esse sentimento. Porém já existem grupo de mães virtuais e presenciais em várias cidades do Brasil, além do apoio psicoterápico.
É importante falar desse assunto com os familiares, e as pessoas mais próximas, e vivenciar esse luto. O bebê existiu e sempre irá existir em sua vida. Os pais aprendem a conviver com a morte em sua vida em tempo integral.
Uma frase muita bonita que demonstra essa vivência: “Oh morte, teu servo bate a minha porta. Ele cruzou o mar desconhecido e trouxe ao meu lar o teu chamado. A noite é como o breu e meu coração treme de medo;mesmo assim, tomarei da lâmpada, abrirei os portões e farei vênia em sina de boas vindas. É o teu mensageiro que está a minha porta. Eu o venerarei de mãos postas e com lágrimas nos olhos. Eu o venerarei, colocando a seus pés o tesouro do meu coração.Ele retornará com a missão cumprida, deixando uma sombra escura na manhã do meu dia; e em meu lar desolado, só permanecerá o meu desamparado ser, última oferta de mim para ti.” TAGORE, GITONJALI
Assim, a ajuda necessária após a perda do bebê é feita pela escuta ativa do psicoterapeuta e dos familiares, que devem estimular o indivíduo a retomar a sua vida. Muitas vezes, os grupos terapêuticos auxiliam nesse estímulo, pois assim a mãe, o pai e a família, encontram outras mães e familiares que passaram pela mesma situação e podem se identificar com suas histórias, o que traz um suporte e acolhimento para essa perda. Não importa se a ajuda vem de um desconhecido ou de um familiar, desde que seja de forma inteira, integral e seja o melhor que a pessoa possa oferecer ao outro.
Dica Coruja: Livro “Até Breve José”. Esse livro é o diária de uma mãe, Camila, que perdeu seu filho 11 dias após seu nascimento na UTI neonatal.
Eu sou Melina, mas pode me chamar de Mel. Amo escrever, amo meu marido, amo minhas três filhas e, acima de tudo, amo Jesus. Moramos na Pensilvânia, nos EUA, e, sempre que consigo, gosto de falar sobre minhas experiências, aprendizados e desafios seja na maternidade, na vida cristã ou como imigrante.
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