Escuro, monstro debaixo da cama, ladrão. Muitas são as causas dos medos infantis e o objeto de sua aversão vai mudando ao longo do crescimento. Mas ver nossos filhos com medo – seja de uma coisa que não existe ou de algo que assusta até mesmo nós – é ruim demais, né? Por isso, conversei com duas ótimas profissionais e reuni neste post algumas respostas para dúvidas comuns sobre este tema. Como lidar com o medo das crianças?
Que responde é a terapeuta infantil Roberta Lima e a psicóloga Camila Machuca, que é especialista em Neuropsicologia pela USP e em PCIT: Parent Child Interaction Therapy pela University of West Virginia (EUA).
Em que idade é mais comum a criança sentir medo?
“Os medos infantis geralmente são mais predominante entre 4 e 6 anos e começam a diminuir aos 7 anos de idade, quando a criança começa a adquirir mais recursos cognitivos e adaptativos”, explica Camila Machuca. O foco do medo muda no decorrer do desenvolvimento da criança, pois à medida que ela cresce e seu mundo amplia. Assim, ela começa a se adaptar e desenvolver novas habilidades para dominar aquilo que antes a assustava. Por isso os medos de uma criança de 3 anos são diferentes dos de uma de 8 anos. Pode-se dizer que o medo é a resposta emocional que acontece entre o confronto de uma nova situação e a capacidade de dominá-la.
As especialistas lembram entretanto que o medo é algo natural ao ser humano. “O medo é uma espécie de mecanismo de alerta e uma forma de nos protegermos de situações que ofereçam algum risco”, explica a terapeuta infantil Roberta Lima. Ela comenta que o componente imaginário tem uma grande influência na percepção de medo na infância. Além disso, as situações vividas também têm um papel importante. “Um exemplo é uma criança que tem medo de um cachorrinho inofensivo porque foi mordida por outro animal no passado.”
Quais são os fatores que podem aumentar os medos infantis?
Como o medo está ligado ao desconhecido, circunstâncias que envolvem novas situações podem contribuir para que a criança sinta medo, como mudança de cidade ou escola, separação dos pais, chegada de um novo irmão, morte de um familiar próximo. “Outro fator que pode acentuar o medo é a superexposição das crianças a informações para as quais não têm maturidade e nem recursos emocionais suficientes, como notícias de guerras, assaltos, sequestros e morte”, ressalta Camila.
Roberta salienta o papel dos pais neste processo: “A forma como os pais e os adultos em geral que convivem com a criança conduzem a situação fará toda diferença para que esse processo de medo natural seja superado tranquilamente ou, num outro extremo, atinja um nível crônico e traumático”.
Há algum problema em eliminar continuamente o fator do medo? Por exemplo, manter sempre o abajur ligado à noite se a criança tem medo de escuro.
Segundo Camila Machuca, em alguns casos não existe nenhum problema em eliminar os fatores que causam o medo, principalmente quando o medo enfrentado pela criança é normal para a fase de desenvolvimento em que se encontra. Contudo é importante também fornecer ferramentas para que gradativamente a criança possa enfrentar seu medo.
“Por exemplo, no caso que você citou, a criança pode dormir com o abajur ligado, mas ao mesmo tempo pode-se promover brincadeiras com toda a família para ajudá-la a enfrentar o medo, como: apagar a luz do quarto e todos com uma lanterna ligada lerem um livro juntos, fazer desenhos sobre coisas legais que acontecem a noite; identificar do que é que ela tem medo que aconteça no escuro, porque digamos que ela tenha medo de monstro embaixo da cama, vocês podem juntos explorar o quarto dela verificando que não tem nada lá, antes dela dormir. Ou seja, de uma maneira lúdica vocês estão ajudando ela a desenvolver recursos para vencer o medo e incentivando maior autonomia. Esse é o maior desafio dos pais, achar o equilíbrio entre acolher o medo da criança e incentivar ele a vencê-lo.”
Os pais não devem ignorar, subestimar nem ridicularizar o medo da criança, pois ela pode se sentir desprotegida e não enxergar mais este adulto como um ponto de apoio e confiança. “O medo de monstros que seu filho pequeno sente, por exemplo, é legítimo. Logo, apenas dizer que tais criaturas não existem, não ajudará muito porque, a depender da idade, a criança não distingue bem entre o real e o imaginário. O melhor a fazer é passar um senso de proteção e segurança ao pequeno”, comenta Roberta.
Além de não menosprezar o sentimento da criança, a psicóloga Camila lembra: “não a force a encarar algo que não esteja preparado para fazer. Evite frases que irão invalidar seus sentimentos como: ‘isso é bobagem’, ‘medo não é coisa de menino’, ‘você é muito covarde mesmo’. Então, não faça chacota com o medo do seu filho. Ele é tão real quanto o medo que você sente, apenas os motivos são diferentes”.
Com crianças em idade escolar, os pais podem conversar com eles de maneira lógica, oferendo razões e explicações simples para que a criança entenda que a razão do seu medo é algo que dificilmente irá acontecer: “Isso que você está temendo no momento alguma vez aconteceu? Se não aconteceu até agora, acha que irá acontecer hoje?”. Nessa idade, você também pode falar sobre como enfrentou as mesmas situações quando era criança e como superou seus medos.
Crianças menores, na idade pré-escolar, ainda não conseguem compreender razões lógicas pelas quais não devem ter medo.
“Neste caso, exemplos concretos funcionam bem, assim como preparar seu filho para a situação que irá enfrentar. Se ele tem medo do médico, você pode dizer por exemplo: sei que o estetoscópio parece assustador, mas ele serve para escutar o coração, ele é geladinho, mas não machuca. Brincar com bonecos e animais de pelúcia deixando que seu filho expresse aquilo que está lhe assustando também o ajuda a expressar os sentimentos e elaborar seu medo, e você pode aproveitar a oportunidade para lhe assegurar que as coisas irão ficar bem. Com medo de escuro, por exemplo, pode-se utilizar recursos como deixar a luz do corredor acesa, um abajur aceso no quarto, deixar a porta aberta. Também pode-se eleger seu bichinho de pelúcia favorito como guardião noturno, dizendo que ele vai ajudar a cuidar dele durante a noite. Também se seu filho já dorme sozinho e acorda com medo, resista a tentação de trazer ele para sua cama; ao contrário, vá até o quarto dele e ajude ele voltar a dormir, reafirmando que ele está bem e seguro”, comenta Camila.
Roberta estimula os pais a entrarem na fantasia com os filhos: “Embarcar na fantasia da criança, estimulando-a a encarar seu medo de frente encontrando uma solução para, por exemplo, o monstro que ela acredita estar debaixo da cama também é uma excelente estratégia. Ex: pegar uma espada mágica e ir para debaixo da cama do pequeno e voltar alegando que aquele monstro foi derrotado. Isso tem um efeito enorme para aliviar a tensão e a ansiedade da criança. Explicar para a criança que o medo é normal e que todo mundo teme alguma coisa também é importante para tranquilizá-la”.
Livros infantis que falam sobre o medo e suas reações também são uma boa ferramenta, pois pais e filhos podem ler juntos e conversar sobre os sentimentos do personagem e o que a criança faria se estivesse em seu lugar, ajudando-a a criar estratégias para enfrentar e entender seus próprios medos.
Quais são os sinais de que a criança precisa de ajuda profissional?
“Quando o medo chega num nível a ponto de limitar a rotina da criança ou quando ele permanece muito tempo além da faixa etária característica. O medo não tratado pode atingir um nível crônico e limitar a vida da criança em algum aspecto psicossocial, além de seguir presente em sua vida adulta podendo se configurar numa fobia ou trauma”, explica a terapeuta Roberta Lima.
Por isso, os pais devem ficar atentos a alguns sinais:
– Medo que aumenta em intensidade e frequência, sem que os pais consigam acalmar a criança ou/e ela tenha recursos para lidar com ele.
– Quando o medo dificulta suas tarefas do dia a dia e traz prejuízos acadêmicos, sociais e funcionais.
– Para algumas crianças, por não saberem expressar seu sentimentos, o medo pode desencadear sintomas físicos, como dor de cabeça, dor de barriga, alergia. Por exemplo: uma criança com medo de ir para a escola pode começar a ter dor de barriga diariamente a medida que se aproxima do horário de ir para a escola e fazer de tudo para evitar esse momento.
Olha que bacana este esquema sobre os medos mais comuns em cada idade, listados pela psicóloga Camila Machuca.
– 0 aos 6 meses: as reações de medo são relacionadas a ruídos fortes ou perda de segurança.
– 7 aos 11 meses: a criança começa a distinguir rostos familiares, por isso pode começar a estranhar pessoas. Pode ter medo de altura também.
– 1 ano: a criança passa a sentir medo quando se distancia dos pais, temendo que eles desapareçam. Esse medo começa nessa fase e se intensifica nos próximos 3 anos.
– 2 anos: as crianças começam a entender a relação causa-efeito e experimentam sua falta de controle sobre o mundo. Podem ter medo de barulhos muito altos como trovões, trens, aspiradores, além de médico, objetos grandes e criaturas imaginárias.
– 3-4 anos: nessa fase a imaginação é muito fértil, por isso costumam apresentar muito medo. Os mais comuns são: medo de máscaras ou rosto coberto (palhaço, pessoas fantasiadas), escuro, monstros, insetos, ficar sozinho.
– 5 anos: aparecem medos mais concretos como: medo de se machucar, medo de cachorro, trovão, ladrão e de se perder dos pais.
– 6-7 anos: nesse estágio do desenvolvimento seu senso de realidade é mais claro, porém ainda possuem uma imaginação vívida. Têm medo de bruxas, fantasmas, tempestades, dormir sozinho, que algo ruim aconteça com os pais.
– 8 -10 anos: os medos passam a estar relacionados em sua maioria a aceitação social e performance. Têm medo de serem rejeitados por um grupo social, medo de ir mal na prova, medo de reprovar.
Eu sou Melina, mas pode me chamar de Mel. Amo escrever, amo meu marido, amo minhas três filhas e, acima de tudo, amo Jesus. Moramos na Pensilvânia, nos EUA, e, sempre que consigo, gosto de falar sobre minhas experiências, aprendizados e desafios seja na maternidade, na vida cristã ou como imigrante.
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Olá
Cheguei aqui nesse site porque meu filho de 4 anos deu uma crise de medo na última sexta-feira, que até agora estou preocupada. Somos evangélicos e sempre nos finais de semana vamos à igreja, meu filho adora instrumentos musicais e sabe o nome de todos. Só que nesse dia ele teve medo de um barítono (um instrumento grande), sendo que ele já viu em outras ocasiões. Infelizmente tive que me retirar do local de tão grande o choro e o nervoso dele. Ele tremia e gritava. Não sei se procuro ajuda….ou se espero mais um pouco. Após o ocorrido conversei com ele ….tentei acalmá-lo…