Já li muitas coisas sobre criação de filhos, mas nada tão completo e que faz tanto sentido quanto o livro Limites para ensinar aos filhos. Ele traz alguns princípios de educação que são básicos e beiram ao óbvio – mas que muitas vezes a gente não se dá conta no turbilhão do dia a dia. Uma das coisas mais legais, para mim, é sobre fazer a criança entender que ela escolheu a punição (já explico melhor ali na frente). Hoje me lembrei disso com algo que aconteceu aqui em casa.
Manuela tem um livro do Mauricio de Souza que é sobre índios. É uma coleção que parece uma enciclopédia com personagens da Turma da Mônica e que cada livro fala de um tema diferente. Um deles é do Papa-Capim e fala sobre índios. Coincidentemente a Manuela começou a aprender sobre o assunto na escola e ficou enlouquecida para levar o livro para a professora e para os colegas. Como ela é super obediente no quesito não levar coisas pessoais para a escola fora do Dia do Brinquedos (#queorgulho hahahaha), ela perguntou para a prof se poderia levar e aguardou ansiosamente pela resposta. Quando foi autorizada, ela voltou para a casa em êxtase: “semana que vem, vou levar o livro do Papa Capim para a escola”. Passados alguns dias, lembrei hoje do assunto e perguntei se ela tinha levado o livro e a resposta foi: “eu não sei onde ele está!”.
Meu primeiro impulso era usar minha voz braba e dizer: “como assim você não sabe onde está? Você não cuida das suas coisas. Dá nisso! Agora ficou sem poder levar o livro”. Mas a sabedoria adormecida acordou, falou mais forte e eu não disse nada. Afinal, ela já está tendo a punição natural daquilo que ela fez. E isso, com certeza, tem mais efeito do que uma bronca minha e um castigo. Além do mais, esse mini acesso de fúria meu iria apenas criar um atrito completamente desnecessário no relacionamento.
Vamos lá a alguns princípios básicos dessa situação e como ele se aplica ao dia a dia da educação dos filhos.
O comportamento errado – não cuidar bem das coisas, não guardar no lugar certo – causou uma consequência natural – não achar o livro – que foi uma punição para a Manuela – que queria muito levar o livro para a escola. Aprendizado: cuidar das coisas para achar quando precisa.
As consequências naturais de um comportamento errado fazem sentido e, por isso, nos levam a mudar o comportamento. É muito mais difícil a criança aprender quando o castigo ou a punição por determinada atitude é algo que não tem nada a ver com a ação original. Por exemplo: se você não fizer a lição no horário, você não vai poder comer sobremesa. WHAT? Não faz o menor sentido.
Agora veja essa situação: Se não fizer a lição no horário, não vai poder brincar ou ver televisão. Faz sentido, porque há horário de estudar e horário de brincar. Quem não cumpre a obrigação, não pode ter a diversão. Vai gastar o tempo da brincadeira para o estudo.
Outro exemplo: Se não almoçar direito, não vai poder comer a sobremesa. Se a criança não tem fome para comer a comida, também não tem espaço para o doce. Também não pode deixar de comer a comida, só pensando na sobremesa. Faz sentido novamente.
Como os “castigos” são consequências naturais, eles se tornam mais justos e fazem sentido na cabeça da criança. Assim, são acordos bem estabelecidos entre as duas partes.
Mas para ser justo mesmo, os acordos têm que ser claros e feitos antes da ocasião. Mais um exemplo para ajudar: você pega a criança assistindo a um programa que você não acha adequado. Se ela tem autonomia para mexer na televisão e você nunca fez acordo com ela sobre o que pode e não pode assistir, não dá para chegar e punir. Mas você pode usar essa situação para estabelecer uma regra que passará a valer a partir daquele momento. “Você só pode assistir a tal e tal canal ou só a programas que tenham a classificação livre (ensine a criança como faz para verificar). Se não obedecer a essa regra, vai ficar dois dias sem ver televisão.” Coerente, justo e pode ser cobrado a partir do momento que o acordo foi feito.
E é aí que entra a escolha da criança (lembrando que estamos falando das crianças um pouco maiores – a partir de uns 3 anos e meio – e que os acordos aumentam em complexidade de acordo com a idade). Se eu tenho um combinado claro e a criança escolhe desobedecer, foi ela que decidiu pela punição. Foi ela que escolheu ficar sem a sobremesa, sem a televisão, sem a brincadeira etc. Isso tira o peso das nossas costas e nós, pais e mães, deixamos de ser os vilões.
– Ah, mãe, mas eu quero!!
– Que pena, filha. Se você queria mesmo, devia ter escolhido a outra opção.
(…)
A criança se torna protagonista de sua vida, responsável pelas suas escolhas, precisa aprender a lidar com as consequências de suas ações e não pode culpar os pais pela punição que recebeu. É lindo, hahahahaha. Mais do que lindo, é coerente e eficiente!
Para completar tudo isso e fechar com chave de ouro, nós precisamos demonstrar empatia. Isso ajudará a criança a derrubar as suas defesas (ou seus ataques) contra nós e também a fará refletir ainda mais sobre as suas escolhas. Exemplo prático mais uma vez:
– Ah, mãe, mas eu quero!!
– Que pena, filha. Se você queria mesmo, devia ter escolhido a outra opção.
– Mas é muito chato eu não poder fazer isso.
– Eu sei, filha. Eu também não gosto quando planejo fazer algo e não dá certo. Da próxima vez, você se organiza melhor.
Só cuidado para não se tornar irônico. Porque é bem fácil de isso acontecer! Para ajudar, pense que todo mundo está sujeito a fazer escolhas erradas e que as consequências realmente são péssimas – pense nas suas! Isso ajudará a demonstrar empatia verdadeira.
A foto destaque deste post é da Adrieli Cancelier.
Eu sou Melina, mas pode me chamar de Mel. Amo escrever, amo meu marido, amo minhas três filhas e, acima de tudo, amo Jesus. Moramos na Pensilvânia, nos EUA, e, sempre que consigo, gosto de falar sobre minhas experiências, aprendizados e desafios seja na maternidade, na vida cristã ou como imigrante.
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