Hoje é dia de ler um lindo relato de parto humanizado. Há dois anos, a gente realizou a palestra “Quem tem medo de parto normal?” e foi um dos eventos mais legais do blog. A querida Jéssica Baker Hessel Ens participou do encontro, pois já estava se preparando para o dia que engravidasse. Essa semana ela separou um tempo para contar como foi a chegada da Beatrice, em um parto humanizado cheio de respeito!
“Há dois meses vivi a experiência mais incrível da minha vida e queria deixar registrado pra que essa memória nunca se perca. E compartilhar com quem tiver curiosidade. É um texto enorme, só leia quem tiver interesse
Bom, preciso começar bem do começo. Desde antes de eu engravidar eu já lia e pesquisava muito sobre parto. Sempre quis um parto normal, mas eu não fazia ideia de tudo que envolvia ter, ou querer, um parto normal. Já tinha ouvido falar em parto humanizado, mas assim como a maioria das pessoas, não sabia exatamente o que isso significava.
Entendi que eu precisava viver essa experiência. Encontrei o médico certo. Encontrei a minha doula, tão querida. E encontrei uma rede de apoio ao parto que foi fun-da-men-tal pra mim, fez toda a diferença nas minhas escolhas e na minha gestação. Sou muito grata a cada uma que me ajudou com informações preciosas durante toda a minha caminhada.
Orei muito sobre o meu parto. O Giba também. Mentalizei o grande dia como eu queria que fosse, profetizei sobre o momento da chegada da Beatrice. Sonhei. Não dei ouvidos a tantas coisas que ouvia no caminho, de pessoas que não acreditavam no parto normal. Eu estava pronta e confiante em Deus.
Eu estava preparada para esperar ela vir até 42 semanas de gestação, mas no fundo eu não queria que ela demorasse tanto, rsrs, queria que viesse com 40 semanas de idade gestacional. Mas a minha vontade não tinha valor algum sobre isso, né!?
Com 37 semanas e alguns dias, eu comecei a ter contrações ritmadas por alguns períodos, mas eram sem dor, apenas o desconforto normal das contrações de treinamento. Foram uns dois dias assim, até contei pra minha doula, e ela disse que era normal, era meu corpo se preparando. Mas eu sentia que ela não iria esperar mais muito tempo, achava que logo ela viria…
Com 38 semanas e alguns dias aconteceu de novo, e pararam de novo. Com 38+6 (quarta feira) eu tive uma consulta com meu obstetra e ele me perguntou se eu queria fazer um exame de toque pra ver se eu tinha alguma dilatação, apesar de eu estar sem sintoma nenhum de trabalho de parto próximo. Eu disse que não. Porque se eu estivesse com alguma dilatação, iria ficar mais ansiosa ainda. E, se não tivesse, poderia ficar frustrada (sem motivo, porque a dilatação pode começar a acontecer só na hora do trabalho de parto mesmo). No final da consulta o dr. Álvaro perguntou pra mim e pro Giba, meu marido, se tínhamos algum palpite de quando ela viria, e nós falamos que no final daquela semana.
Eu não sentia nada ainda, nenhum sinal, e já estava bem ansiosa. Mas continuei a vida normalmente, saí pra passear, jantar, fui pra fisioterapia, pilates… mas eu estava sentindo que algo aconteceria de quinta pra sexta. Queria que ela viesse naquele dia, pedi pra Deus, conversei com ela, falei que se ela estivesse pronta podia vir. Na quinta a noite o Giba quis fazer uma janta pra mim. Enquanto ele fazia, eu coloquei uma música e fiquei dançando na sala, pra ajudar ela a descer e encaixar melhor.
Antes de ir dormir, minha mãe me mandou uma mensagem: “Será que a Bea vem essa madrugada? Tô achando…”. Como assim? rsrs. Respondi que queria que ela viesse, mas que ainda não sentia nada. Fomos dormir. Lembro que acordei perto das 2h pra ir ao banheiro e fiquei decepcionada em ver que nada estava acontecendo. Mas ok, ainda não era a hora e eu estava errada sobre o dia. Voltei a dormir.
Mas dessa vez com uma dor que parecia uma cólica bem forte. Comecei a contar a duração e os intervalos. Estavam irregulares. Resolvi tomar um banho, porque se fosse início de trabalho de parto, as dores continuariam quando eu saísse; se não fosse, iriam passar.
Fiquei uns 30/40min e saí. As dores continuaram. Acordei o Giba e falei: acho que ela vem hoje! Comi alguma coisa, me arrumei, sequei meu cabelo, terminamos de separar todas as coisas que levaríamos pro hospital. Tudo isso parando na hora das contrações e respirando fundo. As contrações já estavam muito doloridas e na hora que elas vinham eu não conseguia conversar. Abaixava a minha cabeça, me apoiava em algum lugar ou me agachava, e respirava. Eu só queria ir para o hospital quando tivesse em trabalho de parto ativo, com uns 6 ou 7 de dilatação. Queria ficar em casa antes disso, sabia que ia evoluir melhor. Então eu sabia que ainda podia demorar um tempo até ser a hora de ir para o hospital.
Às 9h30 liguei pra Patty, minha doula, e ela disse que ainda eram pródromos, pra eu parar de cronometrar as contrações e tentar relaxar. Mas não conseguia mais relaxar. O Giba foi para a empresa um pouco, mas falou que qualquer coisa voltaria logo. Fui para o chuveiro de novo, fiquei lá 1h, ora de joelhos, ora sentada no chão… Não tinha posição confortável, mas deixava a água quente cair na lombar e ajudava a aliviar. Na hora do almoço pedi pra ele vir pra casa, não queria ficar sozinha. Ele fez almoço pra gente, mesmo eu não tendo fome, sabia que o dia poderia ser longo e exaustivo, precisava ter forças.
Fiquei deitada no sofá, vendo TV pra tentar me distrair. E durante todo esse tempo ia conversando com a Patty sobre como as coisas estavam. Lá pelas 15h as contrações estavam durando mais ou menos 1min20s com intervalo de 5/6min. Estava cansada já, elas não davam alívio. Falei pra Patty que elas estavam muuito fortes já e ela respondeu: “ainda tem um tempinho pela frente.” Jesus! Eu só queria ir pro hospital e que ela nascesse logo… Ela perguntou se eu queria que ela viesse pra minha casa, falei pra ela vir umas 17h.
17h e pouco a Patty chegou, e ficou alguns minutos cronometrando as contrações e fazendo massagens para ajudar a aliviar. Ela já havia avisado meu obstetra de como eu estava e em todo o tempo ela ia se comunicando com ele. Meu tampão ainda não havia dado nenhum sinal (o tampão sair é um dos sinais de que o colo do útero está trabalhando e “afinando” pro bebê sair). Por isso ela falou que achava que ainda íamos longe, porque não tinha mais nenhum sinal além das contrações. Ela não queria que fossemos logo para o hospital porque tinha receio de chegarmos lá e eu não ter quase nada de dilatação e termos que voltar pra casa. Eu não ia aguentar voltar e ia me frustrar.
Ela sugeriu então descermos no prédio e caminhar, pra ajudar na dilatação, e irmos pro hospital umas 19h. Concordei. Descemos e estava ventando e garoando. O Giba deu a ideia de irmos andar na garagem. Demos umas voltinhas lá, eu me encostando na parede na hora das contrações e os vizinhos passando… hahaha que vergonha! Depois fomos pra academia do prédio, fiquei fazendo exercícios na bola de pilates e ficamos um bom tempo lá, conversando, ouvindo as músicas da playlist que eu tinha feito pra esse dia.
Patty falou que eu deveria jantar e sugeriu pedirmos uma pizza. Não conseguia nem pensar em comida. Mas pedimos. Depois me toquei que ela tinha dado a ideia da pizza pra me “enrolar” um pouco mais, hahaha. Quando estávamos saindo da academia, as contrações começaram a ficar um pouco mais fortes e mais compridas. Subimos e comemos. Demorou pra eu conseguir comer um pedaço de pizza, cada garfada, uma contração. Já era perto das 20h e resolvemos ir para o hospital. Ela avisou meu obstetra.
No caminho pra maternidade eu só orava, pedindo pelo amor de Deus que eu já estivesse com pelo menos 6cm de dilatação. Não queria de jeito nenhum voltar pra casa (com menos de 4cm eles não internam). Orei muito. Fiquei de olhos fechados o caminho todo, que pareceu durar o dobro do tempo. Chegamos lá e tive uma contração perto da porta de entrada. Fiquei um tempo parada, com o Giba, só depois consegui continuar. Três funcionários do hospital me perguntaram se eu estava com dor. Queria dar uma soco neles, hahaha.
Às 21h fui examinada pela obstetra plantonista. 6cm de dilatação, bolsa protusa (não havia estourado ainda) e colo bem favorável (mesmo sem o tampão ter saído). Meus olhos encheram de lágrimas. Não acreditava naquilo! Só agradeci a Deus! Enquanto isso o Giba estava fazendo o internamento. A suíte de parto estava disponível e resolvemos pegar.
21h30 estávamos lá. Meu médico chegou, perguntou como eu estava, ouviu os batimentos da Beatrice. A Patty foi ligar o chuveiro. Fiquei sentada na bola de pilates em baixo do chuveiro. Luz bem baixinha, playlist tocando, Giba e Patty do meu lado. Dr. Álvaro ficou na ante sala, só ia de vez em quando lá ver como as coisas estavam (isso o Giba me contou depois, porque eu nem lembro de ter visto ele entrando). Fiquei lá por muito tempo. Orava durante todo o tempo.
Cada contração que vinha era menos uma pra ela chegar. E pensava: “Deus não iria me dar uma dor maior do que eu posso aguentar. Eu consigo!”. A Patty falava pra eu vocalizar durante as contrações, porque ajudava a relaxar, mas eu não conseguia. Fiquei quieta durante todo o tempo das contrações. Nos intervalos eu conversava um pouco com o Giba. Não queria sair de lá, a água quente ajudava muito com a dor. Mas sentia que minha pressão estava um pouco baixa por causa do calor. Patty sugeriu ir para o cavalinho. Sentei e não aguentei nem duas contrações lá. Minhas pernas estavam moles. Quis deitar um pouco na maca. Não lembro dos horários, mas acredito que isso já era meia noite e pouco, perto da 1h da manhã. Dr. Álvaro perguntou se eu queria que me examinasse pra saber a dilatação e falei que sim. 7 para 8cm.
Nessa hora comecei a orar ainda mais pedindo pra Deus acelerar o trabalho de parto, eu estava muito cansada. Fiquei ainda alguns minutos na maca e de repente as dores aumentaram muito. Eu sabia que quando começa a aumentar no final, é porque está chegando a quase 10cm. Pensei: “Deus ouviu minha oração, mais uma vez!”. Quis voltar para o chuveiro, fiquei mais um tempinho lá. As dores aumentaram ainda mais. Nessa hora eu não conversava mais. Me concentrava no meu corpo e em tudo que eu tinha aprendido.
E comecei a falar que não aguentava mais. O tal “momento da covardia” tinha chegado. Mas todos estavam proibidos (por mim) de me oferecer analgesia, hahaha. A música começou a me irritar e pedi pra desligar. A dor estava insuportável. A Patty começou a encher a banheira (porque eu havia falado que gostaria de tentar tê-la na banheira, mas parto humanizado não é só na água).
A água estava muito quente pra mim, mas não podiam deixar mais fria se a Beatrice nascesse lá. Nessa hora falei que queria ser examinada de novo. Dr. Álvaro ouviu os batimentos dela e me examinou. Nem lembro da resposta dele, só perguntou se eu estava com vontade de fazer força. Respondi que sim. Então ele falou: “Então faça o que o seu corpo está pedindo.”
Ele já conseguia sentir a cabeça dela. Comecei a tentar fazer força, tentando entender como e aonde. Acho que minha bolsa estourou nessa hora. Continuei um tempo lá. Minha barriga foi ficando cada vez mais baixa. Dr. Álvaro saiu pra pegar as luvas e a Patty ficou ali comigo. Nessa hora ela olhou sério pro Giba e falou: “Chama o dr. Álvaro!”. Ele foi e voltou, não tinha encontrado ele ali fora. Ela olhou de novo e repetiu: “Chama o dr. Álvaro!”. Entendi que ela estava quase nascendo.
O Giba saiu e encontrou ele no corredor, veio correndo. Ela estava nascendo! O dr. falou pra eu encostar na cabecinha dela. Não quis. Estava muito irritada por causa da dor, só queria que acabasse logo. Ela coroou mais, e ele falou de novo pra eu encostar. Encostei. Lembro da sensação da cabecinha molinha, dos cabelinhos flutuando na água.
Meu Deus, eu não podia acreditar! Mais algumas contrações e ela nasceu! Às 2h03 da manhã do dia 27 de janeiro de 2018, depois de 20min de expulsivo. Dr. Alvaro a pegou e colocou direto no meu colo. Aquele corpinho molhadinho, quentinho. Que sensação maravilhosa! Eu só agradecia a Deus e falava pra Beatrice que tínhamos conseguido!! Esperamos o cordão parar de pulsar e o Giba cortou. Aquele cordão que nos ligou durante 9 meses, que fez nós duas sermos uma só. O papai teve o privilégio de cortá-lo.
Ela foi examinada pelo pediatra ali no próprio quarto, com o Giba o tempo inteiro junto dela. Não foi aspirada, não pingaram colírio, respeitaram todo o nosso plano de parto. Ela voltou pro meu colo e já tentei amamentá-la.
Valeu a pena cada segundo, e só por ela eu tive forças pra fazer tudo o que fiz.
Nos dias seguintes várias pessoas vieram me falar que tinham orado pela Beatrice e pelo parto na noite que ela nasceu, até sonharam com isso. Sem saberem de nada. Como Deus é maravilhoso! “Sou eu quem faz vir as dores de parto; será que eu não vou deixar que os filhos nasçam? Sou eu, o Senhor, seu Deus, quem está falando.” Isaías 66:9
Eu sou Melina, mas pode me chamar de Mel. Amo escrever, amo meu marido, amo minhas três filhas e, acima de tudo, amo Jesus. Moramos na Pensilvânia, nos EUA, e, sempre que consigo, gosto de falar sobre minhas experiências, aprendizados e desafios seja na maternidade, na vida cristã ou como imigrante.
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